22 de junho de 2016

Morte e Liberdade: Quando Tudo Perde o Sentido e Isso é Ótimo




Um dia ela acordou triste. Sentou-se na cama e não teve vontade de ir trabalhar.
Perguntava a si mesma pra quê tudo aquilo: aquela casa bonita (pelo menos bonita em seu conceito de beleza),  minuciosamente montada até ficar com a “sua cara” ; perguntou  porque havia gasto tanto dinheiro em móveis, peças de decoração, lençóis novos, se sua vida não mudara.
O homem que amava estava longe e não sabia se voltaria.
A família não se importava com ela: afinal, ela sabia se virar sozinha. Sempre soube. Era tão auto-suficiente, inteligente, capaz, tão Mulher Maravilha, que podia fazer tudo sozinha.  E na mente dos pais dela, ela não precisava de ajuda, de atenção, de presença paterna, materna, de motivos de preocupação, justamente por ser assim, tão eficiente.
Uma Wonder Woman  punida e esquecida, por ser tão Maravilha.

Mas foi trabalhar. Afinal, precisava ganhar dinheiro para se manter e manter seus cachorros.
E dias foram passando, passando, semanas, e ela foi perdendo o interesse nas coisas.
Procurou um psiquiatra, que receitou alguns antidepressivos. Começou a tomá-los, sem sucesso.
Ainda não via mais graça nas coisas que antes dava valor e que a faziam pular de alegria, corar de vergonha, chorar de tristeza, pisotear de raiva, revirar os olhos de saudade.

Trocou de psiquiatra. O segundo receitou remédios mais modernos, e dessa vez, o fracasso foi ainda maior.
Ela dormia bem, se alimentava bem, ia trabalhar, cuidava com esmero da casa, pagava todas as contas, mas era apática diante de quase tudo e mais ainda diante das pessoas.
A opinião delas, o interesse delas, a aprovação delas era totalmente desprezível.  Até as mais próximas, para ela, perderam a importância.
Procurou outro médico. Outros remédios. Em vão.

Meses foram passando e ela continuou do mesmo jeito.
Pior: cada dia que passava, era mais uma coisa, mais uma pessoa, mais um valor que ia para o ralo. E que não tinha retorno.
Pouca coisa havia restado em sua vida: uns dois amigos, dos mais de 100 que possuía, só dois que ela realmente ainda tinha vontade de ver ; seus discos, livros, sua casa, seus cachorros. Passou a ir a shows de rock sozinha, burlando convites e fugindo dos amigos.
Até o homem que amava, quando voltou, para ela já não era o mesmo. Porque ela já não era a mesma.

Então, um dia ela acordou conformada. Sentou-se na cama e  ficou pensando.
Desistiu de tentar se entender. Sabia que estava vendo o mundo  com outros olhos e que essa era uma viagem sem volta.
Estava numa jornada longa e solitária. Pessoas que gostavam de aparecer, que necessitavam de aplausos de outras pessoas, que  eram influenciadas pelas opiniões de outras pessoas,  essa gente não a entenderia. 
Jogou todos os antidepressivos no lixo. Fez uma limpeza nos armários. Doou roupas, livros, rasgou fotos, jogou fora velhos sonhos. Não. Não eram mais sonhos.
Seu velho mundo já não fazia mais sentido e ainda, apenas ainda, não vislumbrara um novo mundo para por no lugar.
Era só uma questão de tempo, de  espera, de paciência. 
Precisava usufruir do vazio. Do silêncio. Da penumbra. Precisava de paz e de uma momentânea, suave e necessária solidão.
Era só isso. Apenas isso. Precisava do silêncio e do vazio até encontrar um novo mundo. 
Não estava mais triste. Estava livre.

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