Scheherazade, a Iluminada filha
do vizir que encantou o sultão com suas histórias maravilhosas, durante mil e
uma noites...com o objetivo de entreter seu rei e assim salvar todas as moças
do reino de serem cruelmente assassinadas.....e num sentido mais amplo, todos
nós, toda a Humanidade...
Scheherazade, que o Ocidente, com
seu materialismo, não compreendeu como deveria, o tamanho da riqueza de suas
histórias e de sua própria lenda.....
...Nos deixou esse lindo conto,
que reproduzo aqui, e que trata de Destino,
Sincronicidade, acaso, mérito, pobreza e riqueza, materiais e espirituais,
entre tantas outras coisas.
Conto-diamante da incomensurável riqueza
cultural e espiritual dos povos árabes e que chegou, depois de milhares de
anos, como joia indestrutível, até nós.
Era uma vez dois velhos sábios,
que sempre filosofavam sobre a vida.
Estavam os dois, certo dia, a discutir sobre as causas
da pobreza : se esta era consequência do destino, se era predestinada ou se era fruto de falta
de visão e mau uso das oportunidades que a vida oferecia.
E se, caso ou outro, o indivíduo
poderia reverter essa situação de ser pobre, seja por méritos adquiridos,
empenhos ou por uma espécie qualquer de recompensa do Destino.
Resolveram então testar o que
pensavam.
Havia no lugarejo um homem
chamado Hassam, muito pobre, casado e com muitos filhos.
Resolveram os dois sábios
doar-lhe uma boa quantidade de joias, para ver o que acontecia.
Hassam então recebeu alegremente as joias mas, com medo de ser roubado, escondeu-as em
seu turbante.
Pegou no sono e eis que vem uma
porção de corvos e....levam embora o turbante recheado de joias!
Hassam, desesperado, correu para contar
aos sábios o azar que a ele sucedera.
Os sábios, espantados, resolveram
que desta vez dariam boa quantia em moedas de ouro a Hassam.
E assim foi feito. Entregaram-lhe
as moedas de ouro e Hassam as levou para casa.
Mas, com medo de ser roubado,
Hassam as escondeu dentro de um pacote de farelo de ração para animais e saiu
para a cidade.
Sua esposa estava em casa e,
procurada por alguns viajantes que precisavam de ração para seus animais, ela, sem
saber, vendeu algumas sacas de farelo a eles e entre elas, a saca com as moedas
de ouro escondidas pelo marido.
Qual a surpresa para Hassam, ao
chegar em casa, e saber da fatalidade!!!
Foi novamente, desesperado,
reclamar aos sábios de mais uma peça que o Destino lhe pregara.
Os sábios, ainda firmes em seus
propósitos, resolveram então que desta vez dariam a Hassam um simples pedaço de
chumbo, mas que dentro dele estaria escondida uma raríssima e valiosa joia, sem
que Hassam soubesse disso.
Hassam então pegou o pedaço de
chumbo, sem saber o que havia dentro, e o levou para casa.
Estava em companhia da mulher e
dos filhos quando chegou seu vizinho, um antigo pescador do lugarejo.
Este lhe disse:
_ Hassam, ontem eu tive um dia
terrível. Minha rede se rompeu e não tenho como consertá-la, o que me impedirá
de pescar e levar alimento para minha
família. Se eu tivesse um bocado de chumbo, poderia consertá-la.....
Prontamente, Hassam lhe ofereceu
o chumbo que ganhara dos sábios, deixando o pescador na mais pura alegria,
dizendo-lhe:
_ Obrigado amigo, e prometo-te
que, depois de consertada minha rede e lançada ao mar, o primeiro peixe que hoje
eu pescar, será teu.
E assim, o pescador usou o chumbo
de Hassam no reparo da rede que, lançada ao mar, pescou muitos peixes e o
primeiro deles, conforme prometido, foi entregue a Hassam como símbolo da mais
pura gratidão.
Hassam recebeu alegremente o
peixe e enquanto o cozinhava, percebeu um imenso brilho dentro dele.
Era um diamante enorme, jamais
visto em toda a redondeza, joia que Hassam logo vendeu a um mercador
estrangeiro por muito, muito dinheiro.
Com o dinheiro, Hassam comprou
muitos animais e também ração para eles e eis!
Entre tantos e tantos pacotes de
farelos comprados, lá estava a saca com as moedas de ouro que havia escondido,
intactas, aquela saca que sua esposa havia vendido para os viajantes.
Hassam, com as moedas de ouro
recuperadas, comprou uma casinha e ao mudar-se para ela viu seu filho mais
velho correndo, vindo do quintal, trazendo na mão um ninho de corvos e
um....turbante.... recheado de joias......
Esse lindo e comovente conto não
fala da riqueza material, porque é uma parábola sobre a riqueza espiritual, o
conhecimento interior, as virtudes, os talentos que, se usados e colocados em
prática, traçam o nosso destino.
Os dois sábios, no conto,
podem representar Deus, o Universo, a
Vida, doando essas virtudes, esses talentos (as joias, as moedas) a alguém que
não as utiliza; ao contrário, as
esconde, “com medo de ser roubado”.
O Acaso, ou o acaso que não é acaso,
mas sim uma Sincronicidade, arrumou um modo para que corvos, viajantes e
pescadores com rede quebrada aparecessem na vida do protagonista do conto, para
retirar o que ele havia ganhado ou para devolver a ele o que havia sido
perdido.
Hassam, pelo seu caráter medroso
e egoísta, escondeu esses talentos simbólicos e os perdeu.
Quando recebeu a joia oculta, envolta
num simples chumbo sem valor material, não temeu ser roubado e foi aí que teve
a chance de modificar suas atitudes e mudar seu Destino, quando doou, de
coração, o metal ao pescador.
Talvez aí resida o mistério do
Destino: nós o construímos com nossas intenções: conscientes ou inconscientes,
expostas ou veladas.
Esses talentos, essas virtudes,
joias que nos foram dadas, não para serem escondidas, mas compartilhadas, devem
ser divididas, passadas adiante: devem tocar os outros e também mudar seus
destinos, como Hassam mudou o seu e o do pescador.
Seriam tesouros que
escondemos, por “medo de sermos roubados”
?
Certamente essas virtudes podem
se manifestar em diversas formas, tanto em um tipo de arte, profissão,
atividade ou através das habilidades que possuímos, que teimamos em desprezar, e que muitas vezes são como o chumbo-diamante
da história : acreditamos que não possuem valor algum, mas servem para um
pescador que não tem como consertar sua rede e lançá-la ao mar.
Esse conto nos leva a pensar que
joia oculta carregamos sob o metal pesado, sob nossos medos, julgamentos, orgulhos,
vaidades, preconceitos, tanto em relação aos outros, à Vida e mais importante:
sobre nós mesmos ; aquelas riquezas imensas que temos dentro de nós, envolta
por padrões petrificados, assimilados, e
que, se fossem essas riquezas compartilhadas, de coração, seriam capazes de enriquecer nossa alma, a de
muitos outros e por consequência, mudar nosso Destino.
O que nos é dado, doado, lá do
Alto, não só a nós pertence.
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